estáticas
Mais um blog. E eu não consigo deixar de pensar que há algo de constrangedor nisso. Quando entro num blog presto sempre mais atenção no fato de ele existir do que em qualquer um de seus conteúdos particulares. Me parece sempre a tentativa de sanar um certo déficit comunicativo das sociedades urbanas, e isso me parece comovente. Trata-se de desferir mais um golpe contra a solidão e seu poder enlouquecedor. Não contra aquela solidão tantas vezes necessária, da qual sabemos poder escapar quando quisermos em direção à algum olhar familiar. Mas contra aquela que nos faz estar, contra a nossa vontade, a sós consigo mesmos esmurrando as paredes da nossa consciência completamente vulneráveis aos juízos obsessivos aos quais nos submetemos cotidianamente na tentativa de nos interpretar, de dar forma a essa coisa amorfa que aprendemos a chamar de "eu". Um blog significa colocar-se sob os olhos dos outros, para que eles traçem sobre os nossos corpos contornos que nos ajudem a nos reconhecer. Pq há um poder enorme no olhar alheio, nos reflexos que vislumbramos nos olhos que nos lêem. Não um poder de objetividade, mas um poder de narratividade. Os olhares aos quais somos submetidos são elementos indispensáveis à essa ficção que chamamos de nossa história, ou nossa personalidade. Somos narrativas vivas onde outras narrativas transitam, mas a sós não passamos de um amontoado de imagens conflitantes que se devoram sem com isso criar outras novas. Pq talvez seja essa a grande diferença. Nessa orgia de sentidos em que vivemos, nesse interfluxo às vezes enlouquecedor de vivências há sempre a possibilidade de criar algo de novo a partir das cinzas que não cessam de cair do céu, dos restos de tudo que foi amado e desfeito antes que pudesse envelhecer. Em nosso tempo, algo que tenha chegado a envelhecer é quase uma assombração. A vida se desfaz e se torna memória antes que tenhamos tempo de firmar nosos pés sobre ela. É por isso que há algo de patético em criar um blog: todos os gestos que empreendemos pra nos eternizar são inevitavelmente patéticos em sua precariedade e impotência, no entanto desapareceríamos se abríssemos mão deles. Só nos resta contar com uma eternidade mais modesta e pequena, que perpetua fragmentos relacionando-os uns aos outros, compondo um mosaico no qual talvez nos identifiquemos no final.
Não sei por quanto tempo vou levar isso adiante mas, por hora, é este o espírito que me anima. O de travar essa luta quixotesca contra o tempo e contra a decadência de vidas que ainda não tive como viver e/ou amar.
Escrevo para mim, para os que amo e para estranhos. E não consigo deixar de pensar que há algo de impressionante e, talvez, até de comovente nessa empreitada.
*******
estática: ruído gerado pela eletricidade da atmosfera nas transmissões radiofônicas.
ao som de Mum, "Finally we are no one"
9 Comments:
Manoel,
Parabéns pela coragem de tornar público um pedaço de si ante a hostilidade do mundo e os infortúnios da auto-exposição.
"Porque há caminhos a perder de vista
E a povoar os sonhos. Muitos.
Porque um pé depois do outro basta
Para uma vida inteira"
Se voce não quer desistir desse blog, então simplesmente não leia outros. Ou leia o outer life, um bom blog. Ou esqueça o que eu disse, isso funciona também.
putz q vou dizer? sempre fui teu fã..adorei o blog, avisa das atualizações, abração.
Sabia que não resistira em ter um blog...
a minha caríssima amiga poly deixou de postar aqui um comentário que me fez por msn. eu achei tão perspicaz, e tão a cara dela, que decidi colocar aqui mesmo sem ter lhe pedido permissão rs
"a sua "eternidade modesta, pequena, e fragmentada"... na verdade, querido manoel, não se trata de espécie alguma de eternidade, não é ? Na melhor das hipóteses, uma categoria mto sui generis de eterno... por isso gosto tanto do Freud qdo tenta remediar a transitoriedade: o segredo envolve bem mais o processo de luto que qualquer outra coisa. Isso é palpável. E me conforta... "
sim, uma eternidade modesta é quase uma contradição de termos, a menos, é claro, que se trate de uma categoria "sui generis" , aquela que o vinícuis captou tão bem... é verdade (eu confesso Poly) não há eternidade alguma. mas há uma sede dela. e essa sede, se bem encaminhada pode fazer com que uma parte das coisas dure talvez não para sempre, mas por muito tempo, mais tempo do que duraria nossa memória. ou algo assim. é a eternidade dos fragmentos, como eu disse no texto. nada se salvará por inteiro, mas os fragmentos estarão para sempre como os destroços de um navio naufragado boiando sobre o mar revolto. se vc se agarrar a um deles talvez tenha sorte rss como deu a entender Walter Benjamin eles serão fonte inesgotável de entretenimento, e o seu devido manuseio a única forma possível de salvação.
Aí, véi, legal o teu blog!
Essa mensagem aí é minha. Num assinei
oi Manolito, lindim seu blog! torco para que continue com ele por mto tempo, pq isso e' sempre tao efemero!! tudo de bom pra vc
valeu todo mundo aí! "voltem sempre" rsss
Postar um comentário
<< Home