16 abril 2006

Meu feriado em Ipanema

Aconteceu.

Não, eu não fui ao Rio. Pelo menos não em "corpo presente". O que aconteceu é que alguma coisa me fez passar um dia inteiro sem ouvir Sigur Rós. Aliás, um não, três! Essa coisa? O velho Tom.

Ano passado eu tinha tomado conhecimento de um álbum entitulado "Tom Jobim Inédito". A bem da verdade, de inéditas as canções não tinham nada, mas o título é devido ao fato de Tom tê-las regravado todas, especialmente para esse álbum. Trata-se de uma coletãnea em comemoração aos 60 anos de Tom, gravada em 1987 e lançada somente em 1995, contendo sucessos seus e clássicos do samba e da bossa nova. Eu que nunca fui de muitos chamegos com a clássica MPB (embora guardasse sempre aquele respeito que qualquer músico minimamente inteligente sabe necessário, e flertasse sempre com a dita "nova MPB") fiquei boquiaberto e ouvi o cd à exaustão naqueles dias. Pois Essa semana me lembrei do disco e o baixei. Resultado: fazem três dias que praticamente não escuto outra coisa (salvo duas exceções: o último da Maria Rita, que passou por aqui bem umas três vezes, e o infernal Reinventing the Steel, do Pantera, que foi trilha sonora de uma arrumação no ap)

Exagero meu? Experimente ouvir então. O disco começa com as clássicas Wave e Chega de Saudade. Ou seja, samba gostoso, do tipo que aplaca qualquer briga de boteco. Experimente: quando vir dois sujeitos se atracando num boteco qualquer corra e coloque qualquer uma dessas pra tocar. Aposto que param na hora. Não há como ser agressivo ao som de uma coisa dessas! É coisa de fazer vascaíno dar tapinha nas costas de flamenguista - ou vilanovense pagar uma cerva pra esmeraldino!

Depois vem Sabiá, triste, nostálgica, com aquele ar sábio e sofrido. Mas logo Samba do Avião e Garota de Ipanema te colocam pra dançar de novo (vocês, digo, pq a mim a natureza proibiu - como dizem, "esse engoliu um cabo de vassoura"). A coisa muda mesmo é com Retrato em Preto e Branco, doída de tão triste. Daí em diante o álbum é de uma melancolia à toda prova. Quer dizer, "à toda prova" é muita coisa porque, ao final, vem Águas de Março, seguida de Samba de Uma Nota Só, que te deixam com aquela "promessa de vida no coração" e te arrancam um sorriso desse tamanho, daqueles de quem sabe que o mundo acaba mas não é hoje não.

Pra quem é músico a coisa fica ainda mais divertida. Eu fiquei mais de três horas em cima de Chega de Saudade pra conseguir tocá-la com esse meu braço duro de roqueiro. Como gostei do negócio já tô pensando num jeito de obter da família Jobim (detentora dos direitos legais da obra de Tom), o financiamento de uma fisioterapia, que certamente se mostrará necessária, devido àqueles acordes cabulosos. Uma verdadeira aula de harmonia.

Um último comentário deve caber à voz de Tom. Como suas obras sempre foram interpretadas por vários artistas diferentes, eu não estava acostumado a ouvir o próprio Tom cantando suas canções, com aquela voz calma e pesada. Pode-se ouvir o fôlego inconstante, parecendo cansado e, com um pouco de imaginação, sentir o cheiro de charuto e uísque pelo ar.

Enfim, um álbum comovente. Daqueles que você ouve e pensa: a vida é melhor por causa dessas coisas.

PS: Pra quem quiser saber mais há o excelente site oficial, com discografia, vídeos, entrevistas, biografia e outras guloseimas. www.tomjobim.com.br

PS2: Um amigo meu, o Marcelo, me disse ter visto a foto que usei pra ilustrar esse texto numa revista e, segundo ele, a legenda dizia que Tom estava a examinar uma partitura de Stravinsky.

7 Comments:

At 7:05 PM, Anonymous Anônimo said...

em matéria de Tom, preciso me atualizar.Que sétimo céu é esse qual você tá falando?Preciso desse album, se é assim.

 
At 8:29 PM, Anonymous Anônimo said...

deixe ele só encostar na sua alma. deixe ele levá-la embora não. tá?

 
At 11:49 PM, Anonymous Anônimo said...

e vale recorrer ao tempo dos suspiros. é a levada do coração num tipo de mar.

é nóis na bossa, no rock que é samba.

 
At 12:25 AM, Anonymous Anônimo said...

Aí, Manoel. Digamos que eu, como você antes desse disco, ainda não assimilei o Jobim como intérprete, entretanto gosto bastante do João Gilberto interpretando as músicas dele - João Gilberto com seu violão e Tom Jobim com seus arranjos foram os caras da música brasileira que mais perto de Deus chegaram. Sugestão anotada.

 
At 12:20 AM, Anonymous Anônimo said...

Eu sou muito apaixonada por bossa nova, em especial, Tom Jobim!

 
At 8:57 PM, Anonymous Anônimo said...

saudades de passar por aqui. gostei muito do que vi: visual novo, melodia nova.
tem aí muitas das minhas músicas favoritas. e todas têm pra mim histórias lindas. "samba do avião" tocando no radinho do avião, águas de março mês passado, retrato em preto e branco, que mal consigo ouvir de doída que é. chega de saudade me marcou adolescência. falaria de todas as outras. mas vai ouvir o cd que vale mais.

conheço esse seu sentimento. quase parece que a aura ressurge, quase parece experiência. passei uns 3 meses ouvindo "transa", do caetano, compulsivamente. tirava horas do dia só pra ouvi-lo. caetano não deve ser sua praia, mas devia tentar, viu?

saudades daquelas todas conversas com você.

beijo, querido, te cuida.

 
At 1:12 AM, Blogger mundosdevidro said...

Ora, ora, se não é a menina que um dia me prometeu roubar todos os meus amigos e depois sumiu (de mim)!

Pois é, é bem o que vc disse memso. Sentir-se, por alguns dias, incapaz de ouvir outra coisa e, melhor, não sentir a menor necessidade de fazê-lo. Um belo cativeiro esse rs. Vou tentar Caetano. Realmente nunca foi minha praia. Em parte por razões musicais mesmo, em parte pq acho ele um bundão. Mas isso te explico depois, por msn, qdo vc me fizer aquela pergunta, e a gente aproveitar pra colocar a conversa em dia.

Saudades tb, mocinha. Que bom que vc voltou.

 

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