24 janeiro 2006

O legista que atualmente cuida do caso da morte de Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André, confirmou que ele foi torturado antes de ser assassinado. É o segundo legista a se ocupar do caso. O anterior foi encontrado morto em seu escritório. No laudo atual há as seguintes palavras: "expressão de terror".

Nesse domingo um homem deu 15 facadas na esposa com quem vivia a 3 anos. O casal tinha uma filha. Facadas no rosto, no peito e nos braços.

Eu aumento o som e me encolho num canto.

Que cansaço.

17 janeiro 2006

Eu vou escrever uma história urbana. É sobre uma mulher, uma jovem bonita e cheia de cicatrizes. Ia escrever um pouco hoje mas ela encasquetou de sentar numa poltrona na sala e não se levanta por nada nesse mundo. Qdo o telefone toca ela tomba a cabeça e fica olhando pro aparelho até ele parar. Eu devia deixa-la assim, secando a porra da garrafa de whisky e soprando fumaça pro alto. Ou posso começar da manhã do dia seguinte, qdo ela acordar. Às vezes é o que dá pra fazer qdo uma personagem se cansa assim. Mas nem ela se move nem eu paro de olha-la. Tão bonita, ela. E não vai morrer por agora, eu acho. Parece-me que ela passou da época de morrer assim, de cansaço. Ao menos por enqto. Pq esses tempos, às vezes, voltam. Mas não vai morrer de cansaço, eu acho. E não vai levantar por nada hoje.

No fundo há um Portishead baixinho, que escorre pelo chão e sobe pelas paredes, tingindo a cena toda com um sarcasmo terapêutico. Uma espécie de formol para a alma.

13 janeiro 2006

Eu tenho uma mania, um defeito talvez: eu violento a vida com palavras. Eu aperto, torço, amasso, quebro a vida se preciso, pra que fique do tamanho das minhas palavras. Mas é uma ilusão boba. No fim ela está mais ou menos como antes, e eu exausto de tentar messurá-la. Faz um tempo que isso começou a doer, daí mudei de plano: dei pra me entregar a vários silêncios. Deixo a vida passar calada, às vezes. Me parece sábio: sorver silêncios em grandes goles, pra que se acalme um pouco o inferno de palavras que nunca pára dentro de mim. Assumir os limites do dizível torna o dizer um pouco mais sereno, e me protege do desespero. Por isso esse texto é pequeno assim.

ps: ontem assisti de novo Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças (grato mocinhas...). E calei um mundo de palavras. Calei-as até de mim. E tudo permaneceu como antes: uma dorzinha quieta, um sorriso de quem vai indo devagar e sem pânico de viver. Numa palavra: calma. Ou ainda: adeus.

09 janeiro 2006

Sou um fiel adepto da alopatia. Adoro remédios. Eles são de diversas cores, vêm em vidros ou caixinhas, têm cheiros esquisitos e se eu quiser saber alguma coisa sobre eles tem um papelzinho que conta tudo. Não dá pra entender nada, mas é pq eu sou burro pra essas coisas. Que tá lá, tá. O simples fato de existirem bulas no mundo já é algo tranquilizador. Deve ser pq tomei remedios demais durante toda minha infância e adolescência. Bronquite alérgico crônico. E é meio engraçado pensar que talvez volte a tomar os mesmos no futuro, por causa do cigarro. Mas tô diminuindo bastante, sério.

O fato é que esse apreço pelos medicamentos nem sempre corresponde ao que sinto pelos profissionais de saúde. Não me entendam mal. Eu os respeito profundamente. Eles facilitam a vida da gente. Mas é que pra isso precisam (não é por mal, eu sei) ser um tanto invasivos no trato do nosso corpo. Não vou listar aqui o que já sofri nesse sentido, na verdade não foi muita coisa, mas se vc quiser ter uma idéia procure saber no que consiste um exame chamado colonoscopia. Têm um tubinho, sabe? E na ponta dele uma câmera... enfim, eu não gosto de lembrar. O fato é que se há uma coisa que eu preso nas pessoas é simpatia e boa-educação. Tenho pouca paciência com gente grossa e antipática. Por isso, sempre que me dirigo à um profissional de saúde fico me perguntando se vai ser uma pessoa bacana. Ter que falar dos males que afligem o seu corpo a uma pessoa que te olha com cara de bosta e murmura coisas que vc não consegue ouvir é uma droga.

Pois bem. Hoje eu fui ao dentista. Envolto pela mesma expectativa de sempre acerca da simpatia do sujeito abri a porta da sala e fui recebido por um caloroso boa tarde. Sorrisão grande o dele, maior ainda o meu, aliviado. Que cara bacana. Me explicou tudo com uma atenção quase excessiva, chegando a ser redundante em alguns momentos. Até que pediu com gentileza que eu me deitasse num lugar que eu não sei como se chama. Faria um exame geral nos meus dentes. Foi qdo a coisa começou a engrossar. Na verdade, nada demais. Eu é que sou fraco demais pra dor (né Nayara?). Ou o artefato que ele manuseava é que era muito pontiagudo. O que eu sei é que ali, de olhos fechados, eu comecei a odiar aquele jovem simpático (não devia ter 40 anos...). A cada pontada meu corpo se contraía de maneira exagerada, dersproporcional. É que a dor, por mínima que seja, me faz ter medo de sentir mais dor.

Não deixo de rir qdo penso no recurso que minha cabeça encontrou pra se defender naquele momento: a cada golpe (exagero, muito exagero) desferido contra minha linda e sensível gengiva eu me imaginava dando-lhe um cascudo, um soco, um pontapé. O fato é que finalizado o exame dos meus dentes o Dr. mancava de uma perna, tinha um braço quebrado, todos os dedos torcidos e um olho que pendia da cavidade ocular. Não, dentes ele não tinha perdido nenhum. Superego de merda.

Quando abri os olhos, lá estava o Dr. sorrindo cúmplice: "eu sei que incomoda". E a calma tomou conta de mim novamente, conduzida pela sensação de alívio pelo fim do espeta-espeta. Sentei diante de sua mesa por mais alguns minutos, combinamos o tratamento. Algumas sessões pra eliminar a hipersensibilidade dos dentes, e outra pra extração dos sisos. E eu fui embora pra casa me sentindo culpado por ter espancado assim um dentista tão legal.

08 janeiro 2006

É pra se viver aos caquinhos, é meu bem? Então tá bom. Meu coração está calmo: um monte de monstrinhos adormecidos. Há tantas distâncias entre as coisas, entre eu e a vida... O mundo está entupido de coisas, e mesmo assim há um oceano de distância entre tudo... Passou a época de querer que isso mude. Por Deus, criança, é hora de aceitar isso! Vai doer menos do que vc imagina. Tá bom: talvez doa mais do que vc poderia suportar em dez vidas. Mas vc não tem alternativas. Tire essas mãos dos olhos um minuto, e arrume essa postura, vai ficar corcunda assim! É pra se viver aos caquinhos... Então vamos lá, eu pego na sua mão. Hoje eu vi uma senhora banguela. Uma coisa impressionante: não parava de rir a mulher! Eu sorrio toda vez que me lembro. Meus dentes, não devem ser eternos né? É preciso saber sorrir banguelo. É isso, um princípio filosófico, uma questão existencial, um imperativo de vida ou morte. Algum sábio já deve ter dito: “aprenda a sorrir e deixe pra lá essa conversa besta de dentes...”

06 janeiro 2006

Esse é um texto que escrevi há alguns meses... não sei exatamente quando. Hoje estava olhando os meus arquivos e o encontrei. Me pareceu bonito. Taí.


Talvez o que mais me constrangesse nela fosse aquele sentimento de vergonha por ser infeliz, que eu notava em tantos dos seu gestos. E eu, que da fraqueza aprendi a tirar alguma ternura, tocava seus cabelos como quem acariciava uma doente terminal. Aquela vida escapando por entre os próprios dedos, aquele tempo selvagem e impiedoso. E eu pensava comigo que cabelos castanhos permanecem castanhos mesmo quando de nós sobram apenas os ossos.

Às vezes, quando eu chegava do trabalho antes dela, me sentava numa poltrona antiga que compramos juntos no começo, e me colocava exatamente na direção da porta. Queria que eu fosse a primeira coisa que ela visse, que meus olhos a pegassem desprevinida. Só assim ela me deixaria por a mão onde doía. E então eu estendia meus dedos, tocava aquela dor já tão antiga, e tudo permanecia igual. Apenas um ligeiro consolo se insinuava no ar. A esperança remota de uma vida ou de uma morte serena. Porque quem pode devolver à uma menina como aquela uma vida q se esvai assim? Quem pode curar alguém de um cansaço tão grande, desfazendo histórias, contando-as de uma maneira nova, que não doa tanto, que torne os braços mais leves? E se você é alguém que não acredita na idéia de vencer a si mesmo.. bem, aí é qvc não pode fazer outra coisa senão olhar aquilo tudo com uma tristeza que de tão grande te protege de todas as outras, porque te entorpece.

Acabava por me pegar com os meus pensamentos em Jesus. Pensando que aquilo tudo, aquela promessa enorme, aquele gesto intenso de quem diz “levanta e anda!", que aquilo tudo tinha de ser verdade, ou que Deus, de alguma forma, tinha de ser verdade. Para que não fosse verdade a obscenidade de uma menina como aquela, a lançar de joelhos suas preces rumo à um céu vazio. Para que não houvesse sempre aquela voz trêmula e aquele olhar cansado, de quem se desculpa porque vai morrer.

03 janeiro 2006

Eu acabei de apagar o último post. Era uma letra do meu querido Elliott Smith. Tinha um comentário, de uma pessoa muito querida. Um comentário muito convincente, diga-se. Realmente, o post era um lamento. E eu não quero cultivar lamentos, por isso, foi-se.

can't stop movin